Arquivo de maio \12\America/Buenos_Aires 2018

A justiça e a grama verde do vizinho

Daniel Alves não vai para a Copa. Assim como Emerson, Edmílson, Romário e tantos outros no passado, o lateral teve que dar adeus ao Mundial por causa de uma lesão. Triste para ele, mais triste ainda para o torcedor, que não consegue confiar em nenhum outro nome para a posição e, diante da incógnita, as mais diversas teorias aparecem: “Precisamos de um outro que seja experiente”. “Tem que convocar o que estiver no melhor momento”. “O futebol jogado no Brasil é muito fraco. Imagine os laterais daqui marcando o Messi?”. Poucos pensam e pedem o que deveria ser crucial: justiça.

Desde criança, todas as vezes que eu dormia na casa de meus avós, um quadro na parede do quarto me chamava a atenção. Nele, Snoopy, o cachorro esperto criado por Charles Schulz, está em cima de um banco olhando o quintal do vizinho sobre o muro. Antes de saber ler, eu já me deparava com aquilo e ficava curioso para entender qual mensagem era passada. Assim que aprendi a juntar as primeiras letras, corri para aquele cômodo e pude finalmente entender o recado: “A grama do vizinho é sempre mais verde, até você descobrir que é artificial”.

“A grama do vizinho é sempre mais verde, até você descobrir que é artificial”

Talvez por esse marco em minha infância, aquela frase virou o ditado popular que mais levei para a minha vida e a lesão de Daniel Alves fez com que, outra vez, Snoopy no banquinho brotasse em meus pensamentos.

Fagner quase sempre foi a primeira escolha de Tite para a reserva. Desde que assumiu a seleção brasileira, o treinador fez dez convocações, com o lateral direito do Corinthians presente em oito delas. Apenas o titular Daniel Alves (oito) foi chamado mais vezes. Outros quatro jogadores da posição também foram lembrados com menos frequência: Danilo (3), Rafinha (2), Mariano (1) e Marcos Rocha (1).

O temor de saber que agora precisamos de um lateral direito titular e não apenas um reserva para Daniel Alves ligou um sinal de alerta. Ser o melhor da posição no Campeonato Brasileiro do ano passado e também no de 2011, quando ainda defendia o Vasco, não basta. Ser o principal líder do vitorioso Corinthians de Fabio Carille é pouco. Ter a confiança de Tite, seu técnico durante duas temporadas inteiras, é apenas um “complô”.

Você pode não gostar do Fagner. Dizer que ele é violento (exagera demais nas entradas, sobretudo em jogos importantes), que ele é protegido por jogar no Corinthians, que não tem experiência de Europa (o que não é verdade, ele já atuou na Holanda e na Alemanha), mas não pode achar injusta a sua convocação.

“Rafinha e Danilo são muito melhores”. Por quê? Ambos são reservas em seus times e o primeiro chegou inclusive a recusar a seleção brasileira com o sonho de defender a Alemanha. Fagner pode ser odiado por muitos torcedores brasileiros, mas é um desafio encontrar um amante do Real Madrid que sinta saudades de Danilo. “Ah…mas eles jogam na Europa, não nesse abismo colossal que é o futebol brasileiro”. Eu prefiro achar que a grama do vizinho é artificial. E ser justo.

Fabinho, do Monaco, é outra opção viável. Vive grande momento, recebeu propostas de gigantes europeus, mas também é verdade que não atua como lateral direito há um tempo. Quando foi convocado por Tite, precisou ser cortado porque se lesionou. Puro azar…ou sorte de Fagner, Danilo e Rafinha, só o tempo irá dizer.

Que Tite tenha suas escolhas muito debatidas, criticadas e elogiadas, mas que seja respeitado. Se a convocação for por confiança, que isso sirva para trazer o hexa. Se for por qualidade, que seja o principal para levantarmos o troféu. E que sejamos justos. Com o treinador, com o convocado e com o futebol brasileiro. Que a grama da seleção esteja bem verde, mas original. Deixemos a artificialidade para nossos vizinhos e a injustiça também.

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